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Representações da imigração na Argentina: discursos e debates na configuração do Museo Hotel de Inmigrantes*

Aletheia, vol. 1, número 2, mayo 2011. ISSN 1853-3701

Artículo/ Lopes en PDF

Maíne Barbosa Lopes**

UNISINOS

Brasil, 2010

mainelopes@yahoo.com.br



Resumen: En un primer momento, el texto estudia algunas de las influencias que permitieron la creación de un museo de la inmigración en la sede de la Dirección Nacional de Migraciones, ubicada en el complejo del antiguo Hotel de Inmigrantes de Buenos Aires, así como los discursos del Ministerio del Interior/DNM en este emprendimiento. A continuación, investigaremos cómo la historia de la inmigración es representada por el Museo del Inmigrante, a partir de un análisis inicial de su exposición de larga duración, armada desde 2001. Si una renovación en la historiografía de la inmigración en las últimas décadas empezó a cuestionar el éxito del proceso inmigratorio, relativizando la tesis del “crisol de razas” en la Argentina, veremos cómo, contrariamente, la exposición vehiculada por el Museo del Inmigrante acaba por reproducir una imagen idílica del pasado de la inmigración en el país.

 

Palabras clave: museo, discursos, inmigración.

 

Resumo: Num primeiro momento, o texto estuda algumas das influências que permitiram a criação de um museu da imigração na sede da Dirección Nacional de Migraciones, localizada no complexo do antigo Hotel de Imigrantes de Buenos Aires, bem como os discursos do Ministério do Interior/DNM neste empreendimento. Em seguida, investigaremos como a história da imigração é representada pelo Museo del Inmigrante, a partir de uma análise inicial de sua exposição de longa duração, montada desde 2001. Se uma renovação na historiografia da imigração nas últimas décadas passou a questionar o êxito do processo imigratório, relativizando a tese do “crisol de raças” na Argentina, veremos como, contrariamente, a exposição veiculada pelo Museo del Inmigrante acaba por reproduzir uma imagem idílica do passado da imigração no país.

 

Palavras-chave: museu, discursos, imigração.

 

O que leva um órgão do governo ou um grupo de pessoas a desejar criar um museu? Esta pergunta, que inicialmente nos levou a gestar nosso trabalho, poderia ser somada ainda à seguinte: é possível que, em uma cidade formada especialmente pela imigração, um museu seja capaz de representar a história de grupos tão diversos e provenientes de trajetórias tão distintas? A partir destes dois questionamentos principais, o presente texto estuda, primeiramente, o momento em que se propôs criar um museu da imigração na sede da Dirección Nacional de Migraciones, em Buenos Aires, observando algumas das influências que possibilitaram a sua criação e os discursos do Ministério do Interior/DNM neste empreendimento. Desde o final dos anos 1970, inúmeros fatores parecem ter contribuído para uma renovação na historiografia da imigração na Argentina, sendo o estudo sobre o impacto imigratório e as formas de inserção dos imigrantes em meio à sociedade argentina os temas que polarizaram o campo migratório nas últimas décadas.

Num segundo momento, buscamos investigar como a história da imigração é representada pelo Museo del Inmigrante, a partir de uma análise inicial da exposição de longa duração nele veiculada e então alojada no primeiro piso do antigo Hotel de Imigrantes desde 2001. De um modo geral, dois elementos principais são identificados na exposição, quais sejam, a combinação do discurso histórico com o político e a valorização somente da imigração ultramarina européia, elementos que, como mostraremos, acabam por reproduzir uma imagem idílica da imigração na Argentina, capaz de legitimar o discurso do “crisol de raças”.

 

 

1.       O museu em sua criação

 

A partir da documentação oficial de que dispomos – isto é, das fontes, em grande parte, ministeriais – soubemos que desde 1983 a Dirección Nacional de Migraciones (DNM daqui em diante), pertencente ao Ministério do Interior argentino, recebia autorização para realizar estudos a respeito da viabilidade de se criar um Museu de Imigração em Buenos Aires. Diante da ausência de resultados desta primeira tentativa, o Ministério do Interior criou, em 1985, com sede em um setor das instalações da DNM, o Museo, Archivo y Biblioteca de la Inmigración, uma vez que possuía uma de suas salas desocupada, o que permitia fazê-lo sem gastos do erário público (1). A DNM, organismo criado em 1949 e dependente do Ministério do Interior, corresponde à antiga Dirección General de Inmigración que desde o início do século XX fora encarregada pelo controle da imigração no país (2). Assim, a atual sede da DNM nada mais é do que o complexo do antigo Hotel de Imigrantes, inaugurado em 1911 para recepcionar os imigrantes em sua chegada ao país, no marco da imigração européia de massas para a Argentina (3).

            Conforme a Resolução de 1985, o Ministério do Interior alegava que existiam motivos e antecedentes suficientes para conceituar o projeto de criação do museu em questão, “como un justo reconocimiento a los inmigrantes que forjaron” a identidade argentina (4). Ainda que este museu tenha sido efetivado somente no início dos anos 1990 – conforme relataram Swidersky e Farjat (5) – este documento nos permite verificar certa atenção do governo argentino para com a preservação da memória da imigração no país. Junto do intento de criação do museu, uma série de atividades voltadas ao tema imigratório começou a ser desenvolvida ao longo das décadas de 1980-90, sendo o Ministério do Interior/DNM, entre outros órgãos do governo, os integrantes desta mobilização. Entre as principais atividades realizadas, destacam-se algumas mostras fotográficas sobre imigrantes, projetos para a preservação dos arquivos da DNM alojados no edifício do ex-Hotel de Imigrantes, assim como o surgimento da modalidade de visita guiada ao complexo da DNM (6).

Tais ações nos levam a identificar um discurso pela valorização dos diferentes grupos que formaram a Argentina e de preservação de seu patrimônio, no qual o prédio do ex-Hotel de Imigrantes começava a constituir-se como um símbolo da imigração no país. É importante destacarmos que o período em que estas medidas de preservação do patrimônio da imigração no país são desenvolvidas pode ser inserido na era do World Heritage (7), conseqüência da mudança de regimes do tempo, assim explicado por François Hartog (2007). Conforme assinalam diferentes autores (Hartog, 2007; Huyssen, 2000; 2002; Nora, 1993; Candau, 2008), desde o final dos anos 1970 e início da década de 1980 as sociedades contemporâneas têm experimentado uma supervalorização do passado e da memória, fenômeno oriundo de uma crise de referências e desta mudança no regime de historicidade. Nas palavras de Huyssen (2002: 19), este seria um momento de “obsessão mundial com o passado”, onde a meta parece ser a recordação total, a musealização do mundo. Logo, para este autor, as diferentes sociedades têm tentado superar o medo do esquecimento com estratégias de sobrevivência, erigindo “recordatórios” públicos e privados, como é o caso dos museus.

No mesmo sentido, por trabalharmos com a preservação da memória/passado da imigração, há que se considerar a influência de um fenômeno de “renascimento étnico” que perpassou a Argentina durante os anos 1980 (Devoto, 1992), sendo este um período de amplo interesse e renovação do tema. Tal demanda não pode deixar de ser relacionada também com o processo de re-democratização política do país e com seus vários desdobramentos. Após dois longos períodos de ditadura militar, “todo um pequeño fragmento de sociedad”, em 1983, começava a se reorganizar sobre a base de solidariedades amplas para reclamar e buscar uma solução para os seus problemas à margem das autoridades (Romero, 1994: 326). Em meio a este ativismo experimentado pela sociedade argentina durante a transição democrática, uma renovação historiográfica pode ser sentida, junto de uma mudança geracional nas Universidades e no CONICET (Devoto; Otero, 2003). Depois de décadas de desinteresse, os estudos sobre as migrações para a Argentina adquiriram uma notável expansão, onde o impacto dos novos enfoques nas historiografias Latino-americanas, ainda que lento e desigual,

“fue probablemente estimulado por la revalorización del pluralismo político y cultural que las transiciones democráticas trajeron consigo tras las largas dictaduras uniformizadoras, y también (por lo menos para los tres países del extremo sur) por una caída de la tensión ideológica que había condicionado tan pesadamente la producción historiográfica en el pasado. También lo fue por una avalancha de iniciativas y de financiamientos que precedentes de los países de origen de los migrantes han estimulado ciertamente las investigaciones sobre el argumento” (Devoto, 1993: 456-457).

 

Em se tratando, especificamente, da historiografia da imigração, é importante ressaltar que o estudo sobre o impacto imigratório e as formas de inserção dos imigrantes em meio à sociedade argentina foram os temas predominantes nas pesquisas neste momento (Devoto; Otero, 2003), onde a idéia de um “pluralismo cultural”, pouco a pouco, questionou o consenso a respeito da existência de um “crisol de raças” no país. Desde os anos 1960, imperava no meio acadêmico argentino uma percepção otimista da imigração, fruto da tese defendida por Gino Germani. Em seu trabalho, o autor compreendeu como exitoso o processo de chegada à modernidade na Argentina, graças à existência de uma sociedade integrada, derivada da mobilidade social que havia acompanhado, então, o último centenário de sua evolução. Logo, para explicar a chegada da modernidade no país, Germani encontrava um herói: o imigrante europeu (Devoto, 1992). Tais idéias, por sua vez, reproduziam uma percepção mais antiga da imigração, exemplificada pelo modelo do “crisol de raças”, em que os imigrantes, ao serem assimilados pela nova sociedade, levariam o país ao progresso. Germani se utilizou deste modelo, porém compreendendo que devido à debilidade da sociedade receptora argentina, era impossível pensar o processo com base no conceito de “assimilação”, sendo mais pertinente trabalhar com a idéia de “fusão”. Para Devoto (1992, p. 13) esta afirmação da fusão era uma mediação necessária porque possibilitava dar ao imigrante europeu a função principal de agente da modernização argentina, onde este, ainda que não fosse nórdico, vinha desempenhar o papel que lhe havia assinalado o pensamento alberdiano.

Segundo Devoto (1992) e Marquiegui (1999), boa parte da literatura posterior se desenvolveu aprofundando as hipóteses sugeridas por Germani e apoiando a existência do “crisol de raças” na argentina. Aos poucos, entretanto, a partir dos anos 1980, começou a surgir uma nova interpretação historiográfica acerca do processo imigratório que contestava o seu êxito e o seu papel transformador da sociedade argentina. Esta contestação, segundo Devoto (1992) era oriunda da corrente do “pluralismo cultural”, então emergente nos Estados Unidos, e contribuía para relativizar o modelo do “crisol de raças” e a imagem idílica do imigrante. Entre as pesquisas renovadas realizadas a respeito do tipo das relações que se estabeleceram entre os imigrantes e a sociedade receptora argentina, o livro publicado em 1980 por M. Szuchman, por exemplo, marca a contestação da tese de Germani. Szuchman não só revelou uma escassa mobilidade social ascendente, como, apoiando-se na análise das pautas matrimoniais, descobriu uma forte dimensão de “pluralismo cultural”, isto é, de autonomia social relativa entre os diferentes grupos de imigrantes, o que contradiz a tese do “crisol de raças” pela qual teria existido uma fusão rápida entre nativos e imigrantes. Mesmo que depois as hipóteses deste autor tenham sido questionadas, para Devoto, o trabalho revela-se como obra de transição na historiografia da imigração na Argentina. Em seqüência, Sam Baily foi o pesquisador que contribuiu mais ativamente para promover uma renovação das interpretações acerca do papel da imigração no caso argentino, uma vez que seus trabalhos constataram altos níveis de endogamia na área urbana de Buenos Aires (Devoto, 1992).

Também Poutignat e Streiff-Fenart (1998), ao tratarem da sociedade americana, lembraram que o modelo da “assimilação” perdeu força diante do modelo do “pluralismo cultural”, nos anos 1970, valorizando uma imagem da sociedade como um composto de grupos que preservam sua própria identidade cultural. Aos poucos, “os ideólogos do pluralismo étnico acentuaram a importância dos diferentes grupos étnicos na definição das identidades sociais e o valor que a pertença étnica representa para os indivíduos” (1998: 73). Em nosso ver, esta influência do “pluralismo cultural” ajudaria a explicar o discurso produzido pelo governo argentino (Ministério do Interior e DNM) quando da criação do museu da imigração, no tocante ao seu empenho pelo reconhecimento dos diferentes grupos e promoção das diferentes manifestações culturais (8) formadores da identidade nacional.

Conforme Devoto e Otero (2003), a reinterpretação pluralista tem sido paralela a um processo análogo da sociedade, de revalorização dos aportes culturais dos distintos grupos que conformam a Argentina, presente tanto nos imigrantes limítrofes, como nos povos indígenas e nos descendentes europeus. As causas deste fenômeno são variadas e complexas e se vinculam tanto com modificações institucionais (no que se refere, por exemplo, ao reconhecimento progressivo dos povos indígenas por parte do Estado), como com a crise econômica que afeta o país (no caso da re-etnização dos imigrantes europeus e seus descendentes). Para Navarrete (2008), após a crise dos regimes integradores (9) nas últimas décadas do século XX, a maioria dos países latino-americanos tem transitado em direção à constituição de regimes multiculturais. Segundo o autor, “este novo paradigma para as relações interétnicas parte da premissa de que as diferenças culturais e étnicas entre os grupos que constituem as nações são realidades essenciais e inquestionáveis e que os sistemas políticos devem refleti-las e preservá-las” (NAVARRETE, 2008: 111). Por se tratar de uma instituição dependente de um organismo do governo – e em especial por pertencer ao órgão que determina sobre os diferentes imigrantes que adentram ao país –, o museu da imigração, mais do que qualquer outro, teria quase que por obrigação a necessidade de refletir este paradigma plural e multicultural de valorização dos diferentes grupos que formaram [e continuam formando] a identidade argentina.

 De todo modo, no que se refere à discussão sobre as formas de inserção dos imigrantes na Argentina, Devoto e Otero (2003) compreendem que em nenhuma sociedade existe um pleno crisol nem um pleno pluralismo, mas que se trata de uma questão de níveis e que estes se definem, em geral, em termos comparativos. Como bem alertou Marquiegui (1999), é preciso ter clareza da existência de diferentes padrões de integração por parte dos imigrantes, sendo este o problema de se estabelecer modelos gerais de interpretação. Contudo, ainda se está longe de esgotar o vasto campo de estudos aberto pelo desafio do pluralismo frente ao ethos integracionista e homogeneizador que forma parte do consenso com que os argentinos têm construído sua imagem do passado (2003: 215, tradução nossa). É assim que, como veremos em seguida, apesar do discurso pluralista a respeito da identidade argentina expressado pelo Ministério do Interior/DNM na criação do museu da imigração, outros discursos podem ser identificados a partir de sua exposição museológica.

Embora a renovação dos estudos migratórios tenha trazido uma série de novos elementos através dos quais os adeptos do pluralismo cultural confrontaram a tese do “crisol de raças” na Argentina, é possível que esta ainda se mantenha presente, de alguma forma, em meio à sociedade argentina. Neste sentido, Marquiegui chama atenção para a necessidade de se estabelecer o modo em que todo o novo conhecimento produzido pode ser reintroduzido no discurso da “gran historia nacional” (1999: 46). Em outras palavras, podemos compreender a idéia do “crisol de raças” como uma espécie de mito que se perdurou durante todo o século XX na Argentina, capaz de ser re-atualizado diversas vezes, sempre que fosse necessário “resgatar” a imagem da Argentina em seu momento de maior crescimento, moderna e próspera, como nos parece ter ocorrido na elaboração do Museo del Inmigrante. Assim, no dizer de Marquiegui, o “crisol de raças” ou a “Argentina enquanto terra promissora” seriam metáforas que sobreviveram ao otimismo desmedido que se manifestou durante as celebrações do Centenário da Independência da Argentina, mas cuja vigência se prolongou por muitos anos, dando a impressão de que recém tivesse acontecido (1999: 39) (10).

 

 

2.       Os discursos presentes no Museo del Inmigrante: o edifício, a exposição, as interpretações da imigração na Argentina.

 

Após uma série de ações desenvolvidas desde a década de 1980 com o objetivo de criar-se um museu dedicado à imigração na sede da DNM, foi aberto ao público, em 2001, o Museo del Inmigrante. A partir de diversos objetos e documentos que já compunham o Museo, archivo y biblioteca de la inmigración, bem como de algumas reproduções fotográficas doadas à instituição pela Mostra CASA FOA 2000, ocorrida no prédio e do empenho de seus diretores, uma exposição museológica pode finalmente ser organizada no primeiro piso do edifício do ex-Hotel (11), funcionando sem grandes mudanças até o seu fechamento em 2009. É com base nesta exposição que queremos investigar os discursos sobre a imigração apresentados na exposição de longa duração do Museo del Inmigrante. Para esta análise, faremos uso principalmente de nossa documentação fotográfica realizada durante as visitas à instituição no período letivo de 2009/01. Amparados na proposição de José Bittencourt (2003), tomaremos os objetos, as fotografias e os documentos que compõem a exposição como o meio a partir do qual determinados discursos históricos tomam forma. Logo, nossa opção metodológica está calcada na perspectiva da cultura material, da qual se faz importante destacar que:

“em anos recentes [...] a interpretação da cultura material tem se tornado uma preocupação acadêmica. Uma razão para isto é o fato de que as coleções museológicas representam a cultura material armazenada desde o passado, enquanto as exposições museológicas são o principal meio através do qual o passado é publicamente apresentado” (PEARCE, 1989 apud BITTENCOURT, 2003: 153).

 

Conforme Meneses (2005), esta abordagem somente se tornou possível a partir da “descoberta da natureza retórica das coleções e o caráter discursivo das exposições, no bojo da chamada “virada lingüística” das ciências sociais (após a década de 1970)” (2005: 14).

É preciso dizer, entretanto, que não faremos uma análise individual de cada artefato/objeto apresentado na exposição, mas olharemos o seu conjunto, buscando os valores e sentidos a eles atribuídos. Junto com Bittencourt (2003), partimos da idéia de que os museus constituem uma relação comunicativa, onde “a compreensão é a função primeira do discurso museológico, pois os objetos reunidos destinam-se a transportar uma mensagem e agir sobre os visitantes que entram no espaço do museu para observá-los” (2003: 159). Deste modo, iniciaremos por uma rápida descrição da sala principal que compõe a exposição do Museo del Inmigrante, destacando os artefatos da cultura material nela expostos, para depois propormos inferências.

            A sala de exposição a ser analisada se localizava no piso térreo do edifício de quatro andares do antigo hotel de imigrantes. Sua entrada se dava pela porta central do prédio, em frente aos jardins que outrora pertenceram ao complexo do Hotel e hoje são parte das dependências da DNM. Ao entrar-se no edifício, era possível, de imediato, compreender o que funcionava ali outrora, pois, de um lado, mesas brancas – imitando as originais feitas de mármore de Carrara – e bancos estavam dispostos, com um grande painel fotográfico ao fundo, reproduzindo o salón comedor, repleto de imigrantes durante uma refeição, na década de 1910, auge do funcionamento do hotel (12). No centro da sala, bem em frente à porta de entrada, havia uma pequena exposição, montada com objetos que pertenceram aos imigrantes em sua chegada, como malas, roupas, sombrinhas, entre outros pertences. Mais adiante, vitrines expunham documentos da época da grande imigração de massas para a Argentina, como passaportes e registros de entrada e saída dos imigrantes nos países, além de objetos pessoais de imigrantes do mesmo período. Ao lado contrário da exposição das mesas que representavam o próprio salão de refeições, havia uma pequena exposição montada com as peças que sobraram do antigo hospital, localizado ao lado do Hotel.

            Também compunham a exposição algumas camas de modelo beliche e com armação de tecido grosso no lugar de colchões, que serviam para ilustrar como dormiam os imigrantes quando alojados no hotel. Nas paredes restantes da sala encontravam-se ainda uma série de grandes quadros com fotografias de imigrantes em sua chegada, muitos com malas. Estas fotografias retratavam os imigrantes igualmente em sua recepção nas dependências do hotel, bem como nas oficinas de trabalho (benefício oferecido pelo estado argentino aos imigrantes que se alojavam no hotel para encontrarem trabalho), além de outras fotografias pertencentes ao acervo da DNM. Em meio a esta grande exposição, formada por uma série de pequenos espaços, havia ainda um local reservado para a consulta à base do CEMLA, com informações sobre as datas de chegada dos imigrantes baseados nos livros do arquivo histórico da DNM.

       A partir desta rápida descrição da exposição, observamos dois elementos principais presentes em seu discurso como um todo, são eles: a combinação do discurso histórico com o político, haja vista a forte presença na exposição da própria história do complexo Hotel de Imigrantes; e a valorização somente da imigração ultramarina européia. Por fim, mostraremos ainda como estes dois elementos principais convergem para um discurso mais abrangente: o do “crisol de raças”.

Por combinação do discurso histórico com o político queremos nos referir à apropriação do tema da história da imigração realizada pelos organizadores do museu [diretores e DNM] para dar destaque a uma parte da história em especial: àquela em que o Estado argentino em seu auge, através das suas políticas migratórias, construiu um grande aparato de apoio aos imigrantes recém-chegados. E isso se torna visível em vários aspectos da exposição. Na reprodução do salão de refeições encontramos a imagem do Estado, fornecendo alimentação para os imigrantes; no espaço montado para aludir ao antigo hospital também verificamos a preocupação por parte do governo em atender aos imigrantes em caso de doenças; os quadros com fotografias dão conta de uma história que é a da imigração, mas especialmente a história dos imigrantes em sua chegada à Argentina. Tais aspectos nos levam a inferir que a exposição apresentada no Museo del Inmigrante trata muito mais da história do próprio Hotel de Imigrantes do que de uma história da imigração na Argentina. 

Sobre este aspecto, há que se atentar para o fato de que, como mostrou Vasconcellos (2007), ao selecionar-se um edifício histórico para abrigar um museu – e neste caso, um edifício declarado Patrimônio Histórico Nacional – existe sempre a intenção de se criar um vínculo simbólico entre o passado, o presente e o visitante, de modo que este se sinta como integrante e herdeiro dos fatos históricos que ali ocorreram. Assim, além do que o museu apresenta em sua exposição, o próprio edifício já traz em si um determinado discurso sobre a imigração, no caso desta pesquisa, capaz de contribuir com a idéia da existência de um grande Estado Nacional argentino no início do século XX, posto que remete à história de sua construção. Logo, partimos do pressuposto de que o prédio escolhido para ser a sede do museu é capaz de portar memórias e de atribuir sentidos e valores referentes ao período de sua edificação. Por suas características físicas e históricas, o prédio do museu é também “objeto da produção de imagens e discursos” (PESAVENTO, 2007: 14-15), elementos que o elevaram à condição de patrimônio.

 Nesta perspectiva, ainda que o museu analisado tivesse por objetivo ressaltar a importância da imigração na conformação da Nação Argentina (13), ele destaca especialmente uma história relacionada à chegada dos imigrantes no porto de Buenos Aires, haja vista que foi instituído no lugar histórico onde ocorreram tais fatos. Logo, tanto os objetos da exposição quanto o prédio exercem a função de representar não apenas as memórias pessoais de imigrantes, mas uma memória comum entre os diferentes grupos de imigrantes, que é a da experiência da chegada num local determinado – a instituição Hotel de Inmigrantes – e num período determinado – o momento da inauguração do Hotel em 1911, como importante obra do governo argentino. 

Do mesmo modo, até na exposição de objetos e documentos que pertenceram aos imigrantes podemos evidenciar o papel do Estado Argentino como o agenciador desta imigração. É neste sentido que aparecem expostos diversos documentos, como folhetos de empresas que faziam as viagens dos imigrantes, apontando para a existência de uma política que inclusive, em alguns momentos, subsidiou a imigração. No tocante aos objetos pessoais depositados em espaços públicos, Meneses (1998) nos lembra da importância do indivíduo no campo da cultura material – no caso desta pesquisa, poderíamos pensar nos indivíduos que doaram os objetos para o museu. Sobre este aspecto, o autor destaca que os contextos institucionais típicos [como os museus] “ressemantizam o objeto profundamente, depositando crostas de significados que se cristalizam em estratos privilegiados, em detrimento dos demais” (1998: 13). É assim que os pertences pessoais de alguns imigrantes, no contexto do museu, perdem o seu valor de uso antigo para se somarem ao discurso da exposição. Em nossa análise, o Museo del Inmigrante não parece dar ênfase ao indivíduo que doou o objeto ou ao indivíduo a quem pertenceu o objeto exposto na exposição, mas, na medida em que o museu prioriza o discurso da “gran historia nacional” (MARQUIEGUI, 1999, p. 46), ele minimiza a voz dos imigrantes, generalizando-os – e justo daqueles que deveriam ser os sujeitos do museu.

Meneses abordou muito bem o fenômeno de mudança de sentido e de função que sucede a um objeto – uma mala que antes servia para carregar roupas em uma viagem, por exemplo, pode assumir perfeitamente a função de peça de museu de imigração hoje. Segundo o autor, a durabilidade do objeto costuma ultrapassar a vida de seus produtores, o que “já o torna apto a expressar o passado de forma profunda e sensorialmente convincente” (1998: 02) além de, neste movimento, trazer marcas específicas para a memória. Assim, faz-se necessário observar que o museu é o espaço da ficção por excelência (Meneses, 2002), onde objetos são expostos com a função simbólica de trazer ao presente elementos representativos de uma determinada cultura ou tempo histórico já passados. Ao serem doados/recolhidos, selecionados e expostos no museu, os objetos deixam de ter a função que receberam inicialmente para adquirirem a função de patrimônio, de objeto de rememoração de um dado passado. É nesta seleção dos artefatos para a composição da exposição que se situa o discurso proferido pelo museu e que, como já enfatizamos, parece estar voltado especialmente para uma história do Hotel de Imigrantes e, por conseqüência, da grandeza do Estado Nacional que o subsidiou.

Um problema a ser notado é que nem todos que imigraram para a Argentina passaram pelo Hotel de Imigrantes ou pelos demais albergues que existiram antes deste ser inaugurado. Como nos mostrou Devoto (2009), por mais que se tenha enfatizado na Argentina o papel das políticas do Estado para atrair imigrantes neste período, estas políticas ocupavam um lugar limitado ante a expansão econômica – pois era a economia que possibilitava o principal incentivo para emigrar à Argentina, e não, o Estado. Para o autor, ainda que fosse oferecido aos recém chegados um conjunto de serviços pelo Hotel de Imigrantes, é preciso lembrar que mais da metade dos recém chegados não se alojava nele, mas eram recebidos no porto ou se dirigiam imediatamente a casas de amigos e parentes. Era uma minoria a que utilizava das possibilidades da “oficina de colocaciones”, por exemplo, que funcionavam no mesmo hotel de imigrantes e que dispunha de oferta de trabalho, sobretudo rural (Devoto, 2009: 251).

Conforme o autor, é correto pensar que alguns imigrantes haviam chegado sem contatos e outros, inclusive, ao destino equivocado, mas a maioria tinha laços sociais prévios no novo país. Para Devoto (2009), é necessário fazer-se a distinção entre grupos com uma longa tradição imigratória e aqueles expulsados subitamente da Europa. Muitos destes últimos eram os que se utilizavam do serviço da “oficina de colocaciones” para conseguirem trabalho ou que eram recrutados em seus portões por mediadores. Os grupos mais antigos que procediam, por exemplo, da Itália, da França e da Espanha, eram os que menos requeriam de seus serviços (Devoto, 2009). Apesar de todos estes aspectos aportados por Devoto, poderíamos dizer que o que a exposição comunica é uma idéia de que todos os imigrantes teriam sido beneficiados pelo aparato oferecido no complexo do Hotel de Imigrantes.

O segundo elemento principal que destacamos do discurso apresentado pela exposição é o da valorização somente da imigração ultramarina européia, característica que, por sua vez, se contrapõe ao discurso expressado pelo Ministério do Interior/DNM quando de sua criação. Por ser um museu com o objetivo de reconhecer os diferentes grupos e promover as diferentes manifestações culturais formadoras da identidade nacional, ele deveria representar a pluralidade das pessoas que adentraram o país. Porém, não encontramos na exposição aquela imigração que não chegou por mar. Ao estar localizado nas margens do Rio da Prata, com o porto ao lado, a exposição enfatizava somente a imigração ultramarina, desconsiderando aquelas migrações que chegaram por terra, por exemplo. Exclui todas as migrações internas, bem como a imigração limítrofe, proveniente de países como Paraguai, Bolívia, Uruguai, Brasil, Peru, Chile, entre outros. Deste modo, não podemos deixar de pensar que, para os organizadores do museu, a única imigração merecedora de ser lembrada [memorada] é a de origem européia. Ainda que alguns imigrantes russos e sírios libaneses apareçam em fotografias expostas no museu, eles parecem estar ali apenas para “simbolizar” a pluralidade dos distintos grupos que imigraram para a Argentina.

Sobre este aspecto, em balanço sobre os estudos migratórios, Devoto e Otero chegaram a evidenciar as limitações deste campo, principalmente por haver permanecido confinado ao âmbito da imigração européia e não ter abordado outras dimensões de pluralismo cultural na Argentina, como as vinculadas com as migrações internas e limítrofes. Neste sentido, a riqueza evidenciada para distinguir grupos étnicos europeus nacionais e, dentro deles, regionais ou microrregionais, contrasta notavelmente com a consideração da população argentina nativa como homogênea ou com escassas diferenças culturais regionais. Nestes estudos, “todo ocorrió como si el pluralismo cultural (vale decir, el análisis de grupos con capitales culturales específicos y diferenciados que perduran en el tiempo) fuera producto exclusivo de los inmigrantes europeos y no ocurriera lo mismo con los inmigrantes internos y limítrofes, a pesar de las notables diferencias regionales existentes en el país” (2003, p. 209). Tais assertivas denotam, portanto, que os imigrantes oriundos dos países limítrofes não foram excluídos somente da exposição do museu, havendo também no meio acadêmico uma carência de pesquisas sobre estes grupos.

A partir destes dois elementos principais que destacamos no discurso da exposição do Museo del Inmigrante, queremos enfatizar como ambos retomam, novamente, o “mito” da existência de um “crisol de raças” na Argentina. Pois, tanto a utilização da exposição para dar destaque ao papel do Estado na construção da nova nação que se organizava, quanto a preferência por mostrar uma imigração predominantemente européia, reproduzem uma imagem idílica da imigração que legitima o discurso do crisol de raças. Em nosso ver, ainda que este modelo compreenda o imigrante europeu como o principal agente da modernização argentina, ele também permite inferir que os imigrantes só alcançaram êxito graças à sua integração com a nova sociedade – à sua “fusão”, no dizer de Germani (DEVOTO, 1993). Isto quer dizer, por sua vez, que no modelo do “crisol de raças” o Estado Nacional argentino também assumiu um papel fundamental no processo de imigração para o país, pelas várias políticas migratórias que sustentou.

Conforme Devoto e Otero (2003), entre os historiadores defensores da idéia do crisol de raças predominava uma certa imagem da Argentina que foi a da tradição progressista, com sua ênfase no cidadão, no rol dos espaços do Estado, como o educativo, niveladores e homogeneizadores (vistos como um bem ou uma virtude) e que no plano teórico e sociológico expressava a chamada sociologia da modernização. Se para os autores, fica claro que esta imagem tinha raízes muito fortes e que vinham desde muito antes dos anos 1960, coincidindo, até certo ponto, “con el sentido común de la opinión ilustrada argentina y con la imagen bastante complaciente que ella (como cualquier otra sociedad) elaboró de si misma” (2003, p. 192), não nos deve causar estranhamento que esta mesma imagem sobre o passado da imigração tenha sido reapropriada na elaboração da exposição do museu.

 

 

Considerações finais

 

 Através da análise realizada, pudemos observar que, apesar das novas interpretações desenvolvidas pelos estudos migratórios na Argentina, estas não marcaram o discurso da exposição veiculada pelo Museo Hotel de Inmigrantes. A exposição analisada não abarcou os novos questionamentos sobre o êxito do processo imigratório e sobre seu papel transformador da sociedade, nem enfatizou com clareza a pluralidade cultural existente na formação da sociedade argentina; ao contrário, pareceu reforçar o consenso sobre ethos integracionista e homegeneizador com o qual, no dizer de Devoto e Otero (2003), os argentinos têm construído a sua imagem do passado (grifos nossos).

Há que se levar em conta que o patrimônio é sempre uma construção – são as pessoas que selecionam um bem cultural para ser preservado – e, portanto, a escolha do prédio do antigo Hotel, enquanto símbolo da Argentina moderna e próspera, para abrigar o museu da imigração não foi aleatória. A intenção dos organizadores do museu, representados nos diretores da instituição e na DNM, parece ter sido justamente a de situá-lo num local que tivesse sido palco de grandes acontecimentos para a imigração no país, sem deixar de lado o papel do Estado Nacional na sua construção. Criado com a justificativa de ser um lugar onde os descendentes de imigrantes pudessem sentir-se representados, o museu da imigração tornou-se menos um lugar de valorização dos diferentes grupos formadores da identidade argentina que um espaço de legitimação de uma memória que se confunde com a própria história do poder do Estado argentino.

 

Notas

 

(1) Conforme MINISTERIO DEL INTERIOR. República Argentina. Resolución Nº 879/85.

(2) Informação coletada em Swidersky; Farjat, 2000: 82.

(3) Quando a imigração passou a acentuar-se no país, desde as últimas décadas do século XIX, o governo precisou arrendar diferentes lugares para albergar os imigrantes em sua chegada, até que encontrassem um lugar definitivo para sua moradia. Dentre estes diferentes albergues que existiram no país, muitas vezes denominados hotéis provisórios, destacamos o Hotel de Imigrantes de Buenos Aires, localizado na dársena norte, entre Retiro e Puerto Madero. Neste novo Hotel financiado pelo governo argentino, a empresa construtora, Udina y Mosca, seguiu o paradigma da arquitetura higienista, que compreendia uma série de pavilhões dispostos ao redor de uma praça central, conforme o projeto do Ministério de Obras Públicas (Insausti, 2000: 8). “La construcción se llevó a cabo siguiendo el orden que la necesidad demandaba. En primer lugar el desembarcadero, luego la oficina de trabajo, la dirección, el hospital, y por último el hotel” (retirado de http://www.migraciones.gov.ar).

(4) Em MINISTERIO DEL INTERIOR. República Argentina. Resolución Nº 879/85.

(5) Segundo os autores, em 1985, as obras de um Museu, arquivo e biblioteca da imigração somente se deram por inauguradas a partir de uma placa fixada em frente ao prédio do ex-hotel de imigrantes, porém sem concretização. “Apenas algunas memorias administrativas, junto a otras de la época del Hotel de la Rotonda, pudieron ser resguardadas. Por otro lado, los antiguos libros de ultramar, con registros posteriores a 1882, se encontraban depositados sin medidas de preservación en el archivo del organismo” (Swidersky; Farjat, 1999: 181).

(6) Conforme Folheto: Migraciones. Más de uma década de difusión histórico documental. Realização de Jorge Luis Farjat. Dirección Nacional de Migraciones, 2010.

(7) Hartog compreende que ao surgimento do tempo da globalização, o tempo da World Economy, aparece, de maneira simultânea, o tempo do World Heritage, especialmente influenciado pelas regulamentações da UNESCO, de incentivo à proteção do patrimônio mundial, cultural e natural (Hartog, 2007: 25).

(8) Respectivamente expressados, nas Resoluções que promulgaram, em 1985, a criação do Museo, archivo y biblioteca de la inmigración e, em 1997, a instituição do Programa Complejo Museo Hotel del Inmigrante.

(9) Conforme o autor, os governos integradores do século XX [como foi o Peronismo para a Argentina] construíram novas definições de identidade nacional, que permitiram a invenção e a formação de novas maiorias nacionais. Estas identidades se amparavam em ideologias que glorificavam a mestiçagem ou a integração nacional, incorporando elementos estratégicos das identidades étnicas dos grupos subalternos, como é o caso do gauchismo na Argentina. Assim, grupos anteriormente discriminados puderam ser incorporados às maiorias nacionais e se considerando parte delas (NAVARRETE, 2008: 109).

(10) Sobre este aspecto, Funes (1998) também corrobora ao observar que entre as “ficções orientadoras” que forjam as “auto-percepções” da nação, o tema da composição étnica costuma ser um passo explicativo sempre presente, onde se apresenta uma nação etnicamente homogênea. Segundo a autora, este é um dispositivo “clássico” nos relatos nacionais, sobretudo na atmosfera do início do século XX. É o Centenário um momento privilegiado para a elaboração e a difusão de sentidos comuns, como o cosmopolitismo, a inexistência de cultura indígena e a homogeneidade racial e lingüística. “Otro tanto ocurre con la idea de crisol en Argentina, y fue la generación del Centenario quien contribuyó decididamente a instalarlo” (FUNES, 1998: 12).

(11) Empreendimento em parte resultante da Resolução MI de 1997, através da qual o edifício do ex-Hotel de Imigrantes havia sido designado como futura sede do antigo Museo, archivo y biblioteca de la inmigración. Conforme MINISTERIO DEL INTERIOR. República Argentina. Resolução Nº 2132/1997.

(12) Segundo Devoto (2009), entre 1881 e 1914, algo entre 4.200.000 pessoas chegaram à Argentina. Dentre eles, os italianos eram por volta de 2.000.000; os espanhóis, 1.400.000; os franceses, 170.000; os russos, 160.000. Nesta imigração, assim como no período anterior, predominavam os homens jovens, de origem rural, que chegavam através de mecanismos migratórios, principalmente em “cadeia”. Entre 1881 e 1910, 36% dos imigrantes retornaram (2009: 247).

(13) Conforme MINISTERIO DEL INTERIOR. República Argentina. Resolução Nº 2132/1997.

 

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* Texto produzido entre novembro e dezembro de 2010.

** Possui graduação em História pela UNISINOS (São Leopoldo, RS, Brasil). Atualmente é aluna do Mestrado [Maestría en Historia] junto ao Programa de Pós-Graduação em História da mesma Universidade, com financiamento do CNPq. Desenvolve a dissertação ‘“Como un justo reconocimiento a los inmigrantes”: discursos sobre a imigração na construção do Museo del Inmigrante de Buenos Aires’, sob a orientação da Prof. Dra. Eloisa Capovilla Ramos. Realizou intercâmbio de estudos na cidade de Buenos Aires entre março e julho de 2009 e entre junho e agosto de 2010.

 

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